1977 foi um ano bom
Eu, recém chegado da cidade grande
Para morar numa cidadezinha do interior de Minas
A liberdade e o contato íntimo com a natureza
Foram as grandes diferenças
Havia muito mato
Muitas frutas silvestres
Às margens do rio
Onde hoje há muitas casas
As pessoas que eu conhecia
Eram jovens e crianças
Ou recém saídas da infância
Todos lutávamos por nosso espaço
Mas ninguém demonstrava assim tanto cansaço
Nossos sorrisos eram mais sinceros
Visto que o futuro não havia ainda sido descoberto
Não havia em nós assim tantas marcas
Nosso brilho era muito mais vivo
Não era assim tão opaco
Nossas vidas tinham muito mais vida
E nossos sonhos eram muito mais reais
E tudo o que era velho para muitos
Para nós era novo
E às vezes
Cheio de mistérios
Nossos caminhos
Mal haviam sido traçados
Por isso não seguíamos em nenhuma direção
Todos os dias
Traziam-nos o sol
A natureza
E a alegria
E meninos por mais um dia
Era tudo o que queríamos ser
Havia em nossos corações
Muito mais amor
E muito mais afeto
Fazíamos piquenique
Nadávamos nos rios
Brincávamos no mato
Cantávamos músicas
Acompanhados por violões
Brincávamos nas árvores da praça
Próximas aos trilhos do trem
Que não haviam ainda sido envenenadas pelos herbicidas
Sonhávamos ser tanta coisa
Olhávamos para o céu a noite
E não víamos constelações
Não víamos planetas
Tudo o que víamos eram estrelas
Das árvores antigas que marcaram nossa infância
Apenas aquela
No alto do morro
Onde fizemos piquenique
E a do Pau Brasil
No caminho do rio
Continuam a projetar sobre nós suas sombras
E de tudo isso
O que mais me dói
Não são essas marcas
Não é ter crescido
Não é o sonho
Não ter sido realizado
Não é nosso brilho
Que se ofuscou
O que mais me dói
É saber que 1977
Ficou a vinte anos atrás.
18/07/1997